domingo, 2 de fevereiro de 2025

ARCANO 15- O DIABO: A SUA SOMBRA

 

Por: Antônio Carlos Flumignan e Randler Michel 

Semiologia do Arcano O arcano 15 do tarô, O Diabo, é um símbolo complexo e multifacetado que carrega diversos significados. Na semiologia, ele representa a sedução, o poder, a tentação e a ilusão. Esta carta é frequentemente associada a desejos materiais, ambições desenfreadas e impulsos instintivos. A figura do Diabo é tipicamente retratada como uma entidade mítica com chifres, asas de morcego, seio feminino e órgão sexual masculino, o falo e uma expressão dominante, mantendo um homem e uma mulher acorrentados aos seus pés, simbolizando a escravidão aos desejos. O Diabo como simbiose de Baphomet corpo andrógino. E segundo o escritor ocultista Eliphas Lévi, Baphomet incorpora uma combinação de opostos: masculino e feminino, bem e mal, luz e escuridão. A simbiose entre o Diabo e Baphomet reforça a ideia de que é necessário confrontar e integrar os aspectos sombrios de si mesmo para alcançar a totalidade. 

Significado numa Leitura de Tarô: Quando o Diabo surge numa leitura de tarô, ele geralmente serve como um alerta para o consulente sobre a necessidade de examinar suas ações e motivações. Pode indicar que o consulente está sendo influenciado por forças negativas como: inveja, magia, vícios, manipulação, ou relacionamentos tóxicos. No entanto, também pode sugerir um grande potencial de transformação, uma vez que identificar e confrontar essas forças pode levar a uma libertação profunda e significativa. Conforme for a relação deste arcano com demais arcanos envolvidos no jogo, trarão a luz da consciência ,algo potencialmente escondido ou oculto. 

Dentro da perspectiva da psicologia analítica de Carl Jung, o Diabo pode ser visto como uma representação da "Sombra", um dos arquétipos centrais do inconsciente coletivo. A Sombra contém os aspectos reprimidos da personalidade, aqueles que são considerados inaceitáveis ou indesejáveis pela sociedade e pelo próprio indivíduo. Jung acreditava que a integração da Sombra é essencial para o processo de individuação, o caminho para se tornar um ser completo e autêntico. Dentro deste contexto analítico escreveu o tarólogo Antônio Carlos Flumignan : "O Diabo surge como um espelho das sombras que habitam o inconsciente, revelando aquilo que evitamos encarar: traumas adormecidos, desejos reprimidos, instintos primitivos e forças internas que fogem ao nosso controle. Para Jung, ele representa a Sombra, esse reservatório de tudo o que negamos em nós, não por ser mal, mas porque não sabemos como lidar com ele. Já Freud nos leva ao território do ID, onde as forças do desejo e da impulsividade se manifestam sem filtros. A verdadeira armadilha do Diabo não está nos instintos em si, mas na repressão desmedida ou na entrega desenfreada. Tudo aquilo que não se integra, que não encontra um espaço de expressão saudável, pode assumir o controle de forma destrutiva. A libertação desse arcano não se dá pela negação, mas pela compreensão e aceitação do que somos em totalidade. Ele nos convida a enfrentar a nós mesmos sem medo, a reconhecer nossas necessidades e fraquezas, sem permitir que elas nos escravizem." 

O Inconsciente Coletivo e a Sombra: O inconsciente coletivo, segundo Jung, é composto de imagens arquetípicas comuns a toda a humanidade. O Diabo, como uma figura arquetípica, ressoa com medos e desejos universais que estão enraizados no inconsciente . O reconhecimento e a integração desses aspectos sombrios são cruciais para o desenvolvimento psíquico, pois permitem que o indivíduo enfrente suas próprias limitações e cresça a partir dessa experiência.

Em suma, o arcano 15 - O Diabo, oferece uma profunda reflexão sobre as forças que moldam nossa existência, tanto no nível consciente quanto no inconsciente. Ele desafia a confrontação de nossas sombras e a busca por liberdade através do autoconhecimento e da transformação pessoal. A simbiose com Baphomet reforça a importância de aceitar e integrar todas as partes de si mesmo, reconhecendo que a união dos opostos é essencial para a totalidade e a realização pessoal.

Referências Bibliográficas

 • Stein, Murray. Jung: O Mapa da Alma. Cultrix, 2000.

 • Flumignan, Antônio Carlos. Artigo Entre a luz e sombra: a jornada dos arcanos 15, 16, 17. Disponível em: Facebook. 

• Silva, Randler Michel. Artigo O Arcano Maior do Tarô 15 - O Diabo: A Sua Sombra. Fusão Cósmica, 2025.

NIETZSCHE E O TARÔ: O DESTINO NÃO ESTÁ NAS CARTAS, MAS EM QUEM AS LÊ

Por:Antônio Carlos Flumigan

O que Nietzsche diria ao se sentar diante de um baralho de Tarô? Talvez arqueasse uma sobrancelha, segurasse uma carta entre os dedos e soltasse um riso irônico antes de perguntar: "Eis aqui o destino, aprisionado em símbolos? Eis aqui a vontade do homem reduzida a imagens sobre a mesa?"

Mas ele não rejeitaria o Tarô por completo. Longe disso. Nietzsche não era um homem de recusar símbolos – ele os desmontava, os reinventava, os incendiava para que deles surgisse algo novo. As cartas, para ele, não seriam janelas para o futuro, mas espelhos. Espelhos da psique humana, da eterna luta entre força e fragilidade, entre criação e destruição, entre a mentira confortável e a verdade que dilacera.

Se houvesse algo que o interessasse nas cartas, seria sua capacidade de revelar, não o destino, mas o homem diante de si mesmo. Não como um escravo de forças ocultas, mas como um ser diante da escolha: aceitar-se como é ou transformar-se no que pode ser.

E então, com esse olhar afiado, ele embarcaria em sua leitura – mas não uma leitura comum. Ele veria nas cartas não um jogo de adivinhação, mas um mapa da existência.

A Torre: Quando a Mentira Cai
Aqui está o primeiro golpe. A Torre ruindo, como tudo que foi construído sobre bases frágeis. Ele daria um sorriso, talvez recordando suas próprias palavras: “Tudo que é erguido sobre mentiras há de ruir”. Deus caiu. As verdades herdadas desmoronaram. Crenças, certezas, estruturas que antes pareciam inabaláveis, agora se transformam em escombros. E o homem? Ele se assusta, se desespera, se apega ao que já não existe. Mas Nietzsche veria aqui um convite, e não um fim. A destruição, para ele, nunca foi a última página, mas a primeira de uma nova história. O espírito forte não lamenta a queda da Torre – ele caminha sobre seus destroços e ergue algo novo, algo verdadeiro.

O Eremita: O Caminho Solitário
Após a destruição, o silêncio. O Eremita caminha sozinho, segurando sua lanterna, afastado da multidão. Nietzsche talvez inclinasse a cabeça diante dessa carta, reconhecendo nela a jornada de quem recusa o conforto do pensamento fácil. Ele próprio caminhou assim, sozinho entre os homens, desafiando o mundo, desconstruindo conceitos, iluminando o caminho não para os outros, mas para si mesmo. O verdadeiro crescimento não acontece entre os gritos da multidão, mas no silêncio da própria mente. É na solidão que se encontra a própria essência, que se dissolve o medo de ser quem se é. O Eremita não se isola por fraqueza – ele se fortalece.

O Julgamento: O Chamado Para Se Tornar Quem Se É
E então, o renascimento. O Julgamento não traz castigos ou recompensas – isso seria uma tolice cristã. O que essa carta anuncia é um chamado: Levanta-te! Escolha ser mais do que foste até agora! Para Nietzsche, não há tribunal celestial, apenas a própria consciência, exigindo uma resposta. O homem pode se arrastar pelas sombras do que já foi ou pode erguer-se, ressignificar-se, aceitar que cada dia é um novo campo de batalha onde pode criar-se novamente. E é aqui que mora a verdadeira liberdade: não em aceitar um destino imposto, mas em moldá-lo com as próprias mãos.

Nietzsche e o Tarô: A Verdadeira Escolha
No fim, Nietzsche não se renderia às cartas como destino. Ele as arrancaria da mesa e perguntaria: "E agora, o que você fará com isso?" Porque, para ele, não era o Tarô que falava sobre o futuro – era o homem que escolhia como interpretá-lo. E essa escolha, essa possibilidade de olhar para si mesmo e decidir, era tudo o que realmente importava.

O Tarô, então, não diria o que será, mas sim o que pode ser. Um convite, não uma sentença. Um espelho, não uma prisão.

Porque o destino não está nas cartas. Está em quem as lê.