O
que Nietzsche diria ao se sentar diante de um baralho de Tarô? Talvez arqueasse
uma sobrancelha, segurasse uma carta entre os dedos e soltasse um riso irônico
antes de perguntar: "Eis aqui o destino, aprisionado em símbolos? Eis aqui
a vontade do homem reduzida a imagens sobre a mesa?"
Mas ele não rejeitaria o Tarô por completo. Longe disso.
Nietzsche não era um homem de recusar símbolos – ele os desmontava, os
reinventava, os incendiava para que deles surgisse algo novo. As cartas, para
ele, não seriam janelas para o futuro, mas espelhos. Espelhos da psique humana,
da eterna luta entre força e fragilidade, entre criação e destruição, entre a
mentira confortável e a verdade que dilacera.
Se houvesse algo que o interessasse nas cartas, seria sua
capacidade de revelar, não o destino, mas o homem diante de si mesmo. Não como
um escravo de forças ocultas, mas como um ser diante da escolha: aceitar-se
como é ou transformar-se no que pode ser.
E então, com esse olhar afiado, ele embarcaria em sua
leitura – mas não uma leitura comum. Ele veria nas cartas não um jogo de
adivinhação, mas um mapa da existência.
A Torre: Quando a Mentira Cai
Aqui está o primeiro golpe. A Torre ruindo, como tudo que
foi construído sobre bases frágeis. Ele daria um sorriso, talvez recordando
suas próprias palavras: “Tudo que é erguido sobre mentiras há de ruir”. Deus
caiu. As verdades herdadas desmoronaram. Crenças, certezas, estruturas que
antes pareciam inabaláveis, agora se transformam em escombros. E o homem? Ele
se assusta, se desespera, se apega ao que já não existe. Mas Nietzsche veria
aqui um convite, e não um fim. A destruição, para ele, nunca foi a última
página, mas a primeira de uma nova história. O espírito forte não lamenta a
queda da Torre – ele caminha sobre seus destroços e ergue algo novo, algo
verdadeiro.
O Eremita: O Caminho Solitário
Após a destruição, o silêncio. O Eremita caminha sozinho,
segurando sua lanterna, afastado da multidão. Nietzsche talvez inclinasse a
cabeça diante dessa carta, reconhecendo nela a jornada de quem recusa o
conforto do pensamento fácil. Ele próprio caminhou assim, sozinho entre os
homens, desafiando o mundo, desconstruindo conceitos, iluminando o caminho não
para os outros, mas para si mesmo. O verdadeiro crescimento não acontece entre
os gritos da multidão, mas no silêncio da própria mente. É na solidão que se
encontra a própria essência, que se dissolve o medo de ser quem se é. O Eremita
não se isola por fraqueza – ele se fortalece.
O Julgamento: O Chamado Para Se Tornar Quem Se É
E então, o renascimento. O Julgamento não traz castigos ou
recompensas – isso seria uma tolice cristã. O que essa carta anuncia é um
chamado: Levanta-te! Escolha ser mais do que foste até agora! Para Nietzsche,
não há tribunal celestial, apenas a própria consciência, exigindo uma resposta.
O homem pode se arrastar pelas sombras do que já foi ou pode erguer-se,
ressignificar-se, aceitar que cada dia é um novo campo de batalha onde pode
criar-se novamente. E é aqui que mora a verdadeira liberdade: não em aceitar um
destino imposto, mas em moldá-lo com as próprias mãos.
Nietzsche e o Tarô: A Verdadeira Escolha
No fim, Nietzsche não se renderia às cartas como destino.
Ele as arrancaria da mesa e perguntaria: "E agora, o que você fará com
isso?" Porque, para ele, não era o Tarô que falava sobre o futuro – era o
homem que escolhia como interpretá-lo. E essa escolha, essa possibilidade de
olhar para si mesmo e decidir, era tudo o que realmente importava.
O Tarô, então, não diria o que será, mas sim o que pode
ser. Um convite, não uma sentença. Um espelho, não uma prisão.
Porque o destino não está nas cartas. Está em quem as lê.
domingo, 2 de fevereiro de 2025
NIETZSCHE E O TARÔ: O DESTINO NÃO ESTÁ NAS CARTAS, MAS EM QUEM AS LÊ
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