Por: Randler Michel
O Tarô é popularmente visto como uma ferramenta para prever o futuro ou desvendar segredos. No entanto, se o encararmos pela lente da Psicologia Analítica de Carl Gustav Jung, ele se transforma em algo muito mais profundo: um mapa vivo da psique humana e um espelho simbólico da alma. Para Jung, o Tarô não se trata de superstição, mas de uma linguagem arquetípica, um diálogo silencioso entre a consciência e o vasto território do inconsciente coletivo.
O Chamado das Imagens Arquetípicas:
Carl Jung dedicou sua vida ao estudo dos símbolos, percebendo que as imagens que nos tocam não são meras criações culturais ou invenções do ego. São, na verdade, emergências do inconsciente coletivo, as formas primordiais que ele chamou de Arquétipos.
É aqui que reside o poder do Tarô. Cada Arcano Maior — do Mago à Imperatriz, do Eremita ao Diabo — é uma personificação desses arquétipos universais. Quando olhamos para uma carta, não estamos apenas vendo uma imagem; estamos ativando uma memória ancestral que vibra dentro de nós.
O Tarô opera por ressonância simbólica. Ele não nos oferece uma explicação lógica do que está por vir, mas provoca uma reação, um "arrepio psíquico", que nos obriga a escutar o que a alma já sabe.
A Grande Viagem: O Processo de Individuação:
Os 22 Arcanos Maiores compõem uma narrativa viva, que Jung interpretaria como a jornada da Individuação: o processo de tornar-se a totalidade que se é, integrando o ego (a consciência) ao Self (o centro total da psique).
* O Louco (Arcano Zero): O Salto de Confiança
A jornada começa com o Louco, o andarilho que caminha à beira do abismo com um sorriso de entrega. Ele representa o impulso primordial de iniciar o caminho, o momento em que quebramos o roteiro e nos lançamos no desconhecido, confiando no movimento da alma, não nas garantias do mundo.
* O Confronto com a Sombra:
Em momentos-chave, a jornada nos apresenta cartas desconfortáveis, como O Diabo e A Torre. O Diabo não é o mal; é a Sombra, a parte de nós que foi banida da luz e que precisa ser reconhecida. A Torre é o colapso necessário das nossas falsas estruturas e personas. Segundo Jung, só se encontra o Self real quando a persona se quebra.
O Tarô, com sua coragem simbólica, nos força a encarar o que evitamos. A Morte não é o fim, mas a transição; o Enforcado não é castigo, mas a suspensão voluntária do controle para permitir a transmutação.
Sincronicidade: O Oráculo Interior
Jung também observou um fenômeno misterioso ao lidar com o Tarô: a Sincronicidade, a coincidência significativa entre um estado psíquico interno (um pensamento, um sentimento) e um evento externo (a carta tirada).
Ao embaralhar o Tarô, ativamos um campo simbólico onde o inconsciente e o mundo exterior se tocam. A carta "certa" que aparece no momento exato não é acaso, é o universo respondendo com sentido, e não com lógica. O Tarô revela a verdade simbólica do presente, mostrando a condição da alma de forma tão precisa que o futuro é apenas a consequência natural do que está sendo vivido agora.
O Tarô, portanto, não serve para prever nosso destino, mas para nos ajudar a despertá-lo. É um instrumento precioso para a escuta interior, um ritual que nos conduz, passo a passo, de volta à inteireza do nosso ser.
Referência Bibliográfica:
JUNG, Carl Gustav.(2008) O homem e seus símbolos. Tradução de Maria Lúcia Pinho. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira.
Nichols, S. (2000). Jung e o Tarô: uma jornada arquetípica (9ª ed.). São Paulo: Editora Cultrix.

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